domingo, 27 de março de 2016

Os Três Reinos

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Triskle (ao centro a Triketa), representação dos Três Reinos na cultura celta. Em sentido horário usado para expansão, em sentido anti-horário usado para proteção.

Por Ávillys d’Avalon.

Neamh nglas, muir más, talamh cé.”
“Céu azul, belo Mar, Terra presente.”
(Invocação de Blathmac mac Cú Brettan)

Para os celtas Três Reinos compõem a existência da Terra Média. A Terra Média, ou Mundo Intermediário é parte da concepção cosmológica celta, que acredita haver três Mundos (um acima, um ao meio e um abaixo) – nós poderíamos hoje dizer três universos. Nós e tudo o que conhecemos, sentimos e sabemos vivemos no Mundo do meio, ou Mundo Intermediário ou Terra Média.

O alcance aos outros Mundos nos é vetado e tudo o que temos conhecimento está fisicamente locado na Terra Média: Deuses, fadas, ancestrais, outras terras... E tudo isso pode ser alcançado fisicamente por quem souber navegar para o Oeste ou tiver a “sorte” de atravessar um portal.

A Terra Média possui então Três Reinos: o Céu sobre nossas cabeças, a Terra sob nossos pés, e o Mar que nos rodeia. E assim, tudo o que existe, pertence a um dos reinos.[1] Não nos é difícil entender porque dessa relação muito presente sobretudo nos celtas irlandeses: a Irlanda é uma ilha com um céu sobre ela, uma terra firme para pisar e um gigantesco mar circundante. Mas se formos parar para pensar, tudo o que existe não é assim? Não seria o espaço sideral uma prorrogação de nosso circundante mar nos conduzindo a outras terras (deferentes da nossa mas igual em existência)?

Desse modo, o Céu é o Reino de Nwyfre, do Ar, Reino dos Deuses e dos animais que voam e planam. É do Céu que vem a inspiração e o contato com os Deuses. Ele é o nosso Reino Acima.

A Terra é o Reino de Calas, da Terra, Reino dos Espíritos da Natureza (as fadas que vivem entre nós), dos homens e dos animais que andam e rastejam. É da Terra que vem a sustentação, e o caminho para o desenvolvimento. Ele é nosso Reino do Meio.

O Mar é o Reino de Gwyar, do Mar (das águas), Reino dos Ancestrais e das fadas (as que não vivem entre nós), dos animais que nadam e mergulham. É do Mar que vem as provações, a condução e os sentimentos. Ele é nosso Reino Abaixo e ao Redor.
            
No centro do Mundo encontra-se então a Árvore do Mundo, aquela que conecta e mantém os Três Reinos. Para os celtas essa árvore é um freixo com galhos altivos que alcançam os céus, tronco firme que sustenta a terra e raízes profundas que alcançam o mar (as águas). Na sua frente queima a Awen (ou Imbas), o fogo sagrado.

Que o céu caia e me esmague, que o mar se erga e me afogue, que a terra se abra e me engula se eu quebrar esse juramento.
(juramento irlandês)

E eis um juramento muito respeitado e de grande poder entre os celtas irlandeses. Seu maior temor era exatamente esse cenário apocalíptico em que o desequilíbrio (talvez o fim da Árvore do Mundo) levasse ao caos entre os reinos, fazendo o Céu cair, o Mar invadir a Terra e a Terra se abrir.


“Não sei qual o meu destino.
Viajo para muito longe das ondas.
Procuro minha alma, onde ela está?
Eu olho a estrela para me guiar de volta.

Há uma ilha no oeste,
Terra sob o Céu e sobre o Mar,
Viajo para muito longe em minha busca.
Procuro um guia para me conduzir.

Um ramo de prata em minha mão
Com flor de cristal e fruto dourado,
A mãe árvore cresce na praia;
É lá que eu devo encontrar minha raiz.

Há uma ilha no mar,
Onde as águas fluem e o alimento dá a vida,
Onde não há inimigo, onde o amor é livre.
Procuro um lugar onde não aja contenda.

Eu olho a estrela para me guiar para casa,
Encontro o repouso da minha alma e meu espírito,
Viajei muito além das ondas,
Pois não há fim em minha busca.”
(poema de Catlín Mathews para a travessia da alma apud Rowena A. Seneween)[2]




Sugestões de leituras:

SENEWEEN, Rowena A. O que são os 30 dias druídicos In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=51>.


Referências:

Schleichuberti, João Eduardo. Elementos Místicos do Druidismo e sua interconexão e uso prático [palestra] In VI EBDRC. Circulação interna. Curitiba, 2015.

SENEWEEN, Rowena A. 2º Dia: Cosmologia In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?


_________________. 4º Dia: Três Reinos In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=55>.

_________________. 5º dia: Elementos In Templo de Avalon. Disponível em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=56>.





[1] Particularmente eu articulo os reinos igualmente como Acima, ao Meio e Abaixo, seguindo a seguinte ordem: Céu acima, Terra ao meio, Mar abaixo. Minha justificativa é simples: uma árvore possuí seus galhos altivos no céu, seu tronco está na terra, e suas raízes profundas buscam água. Mas conheço e reconheço outras vertentes que, por exemplo, articulam Céu acima, Mar ao meio, Terra abaixo, usando duas justificativas: a primeira relacionada ao fato de que pisamos sobre a terra, por isso ela estaria abaixo de nós; o mar nos circunda, o que dá uma ideia de meio. A segunda justificativa que corrobora com essa visão são as articulações dos caldeirões: Coíre Sois, na cabeça, se articula com o Céu; Coíre Ermaí, no peito, se articula com o Mar; e Coíre Goíriath, no ventre, se articula com a Terra. Vejo profunda coerência nessa vertente. Mas eu particularmente, tendo a entender que a posição dos Reinos não interfira em sua atuação. O Mar, mesmo abaixo nos circunda. Referências mitológicas como a Terra Sob as Ondas (lar dos ancestrais) também me fazem pensar no Mar como abaixo. Por fim, se recriarmos a ideia cosmológicas dos Três Mundos estando nós habitando o intermediário, seria fácil presumir que também habitemos o Reino Intermediário. Mas essa é uma reflexão extensa e que creio ser insolúvel. Faço aqui uso das palavras de Bellouesus para mim no VI EBDRC: “se dá certo para você, então está certo”. Estude e escolha sua perspectiva, se ela for coerente e funcionar, viva-a.
[2] Retirado de Seneween, Rowena A. 4º dia: Três Reinos In Templo de Avalon [S. I.]. Disponível em: <http://www.templodeavalon.com/modules/smartsection/item.php?itemid=55>.