sábado, 1 de junho de 2019

Panteão Clânico - Parte 6: O deus Lugh

Os textos dessa série serão escritos sempre pelo nosso druida, Ávillys d'Avalon, e assim trazem as percepções, estudos e compreensões do druida e de nossas práticas clânicas, muitas vezes com um caráter profundo de gnose pessoal, ou seja, não dependendo muito de referências bibliográficas específicas. Muitas das bibliografias sobre os deuses celtas são profundamente pessoais e subjetivas já que os druidas do passado não nos deixaram efetivamente nenhum texto escrito ou orientação fundamental.

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Por Ávillys d'Avalon.

Lugh é um deus bastante conhecido e reverenciado nos grupos de espiritualidade céltica até por ter um dos grandes festivais com seu nome, Lughnasadh. É conhecido como o deus dos 365 talentos, pois ele possui todos os talentos e foi esse o “talento” ou a proeza que o possibilitou ser aceito entre as Tuatha dé Danann (as tribos dos deuses talentosos). As Tuatha dé eram um dos povos divinos da Irlanda, e o pré-requisito para ser um Tuatha dé era ser talentoso em algo ímpar.

Lugh é filho de Cian, filho de DianCécht com Eithine, filha de Balor. Cian e Eithine em algumas versões estavam apaixonados, em outras apenas ele a cortejava. Mas Balor mandou aprisionar sua filha em uma fortaleza, pois fora profetizado que seu neto o destruiria. Entretanto, Cian rompe as forças de Balor discretamente e se deita com Eithine, que gesta e gera Lugh. Mas por segurança, ela escondeu e doou a criança, para que não fosse descoberta por Balor. Assim, Lugh é criado por Tailtiu, uma deusa e rainha dos Fir Bolg.

Lugh consegue, assim, “unir” os três povos divinos da Irlanda. Ele é filho de um Tuatha dé com uma fomoriana e é criado por uma Fir Bolg. Recordando: as Tuatha dé Danann é o povo que chega requisitando a soberania de Ériu (Irlanda) a partir de sua peregrinação pelas quatro ilhas ao norte do mundo (podemos pensar que representam a chegada dos celtas). Os Fir Bolg é o povo divino que habitava a Irlanda antes da chegada dos Tuatha dé Danann. E os Fomores são os deuses ou seres primordiais, geralmente cruéis, que habitam as profundezas dos mares.

Após a vitória, liderada por Nuada, das Tuatha dé contra os Fir Bolg na Primeira Batalha de Mag Tuired (Moytura), e após Nuada recuperar seu braço e reivindicar novamente o trono das Tuatha dé que até então estava com Bres, o Belo, um rei corrupto e tirânico, as Tuatha dé entram em guerra contra os Fomores, numa guerra que seria talvez a mais intensa da saga irlandesa. É nas proximidades dessa batalha que Lugh se junta às Tuatha dé Danann, apresentando possuir todos os talentos.

Ao revelar ao rei Nuada sua verdadeira origem, sua maestria militar e ser o neto da profecia que destruiria Balor, Lugh recebe o trono das Tuatha dé temporariamente, para guiar as forças contra os Fomores. A vitória só vem, entretanto, quando Lugh desafia Balor, o gigantesco rei dos fomores de um único olho enorme que quando aberto incendiava tudo que olhasse. Lugh usa a arrogância e prepotência de Balor e sua sagacidade e maestria para derrota-lo acertando seu olho com a lança (em algumas versões com uma pedra), arrancando o olho de Balor de sua cabeça e conduzindo-o ao céu, onde esse olho aquece e fertiliza os grãos. Para evitar problemas, Lugh prende a cabeça de Balor em um Espinheiro Branco que passa a ter uma sobrevida pelo veneno do sangue do rei fomoriano.

Após a vitória das Tuatha dé na Segunda Batalha de Mag Tuired, os fomorianos se retiram de Ériu, mas antes de fugir, Bres implora a Lugh por sua vida, oferecendo que os campos sempre tenham grãos, mas Lugh recusa, pois o ciclo da terra precisa ser mantido; em seguida oferecendo que as vacas sempre dariam leite, Lugh recusa, pois as vacas não poderiam estar sempre grávidas; ensinando a arte da agricultura aos Tuatha, o que é aceito por Lugh. Infelizmente, entre as baixas dessa batalha estava o rei das Tuatha dé, Nuada.

Lugh instituiu o festival da colheita, Lughnasadh, que acontece tradicionalmente em agosto, como um dia sagrado de jogos, feiras e competições em honra a sua mãe adotiva, Tailtiu, em honra ao sacrifício dela para que a terra se fertilizasse.

Desse modo, Lugh é reverenciado como o deus da poesia, da música, das artes, da vitória, das chuvas, do relâmpago, da medicina, dos talentos. Sua relação com as chuvas e com o relâmpago está em sua relação com Balor. O olho de Balor é associado ao sol quente demasiado, que é golpeado pela Lança de Lugh (raio), fazendo Balor sangrar (chuva). Erroneamente, Lugh é associado ao sol. Ele não é deus do sol, no máximo pode ser associado ao percurso solar (a retirada do olho de Balor, enviando-o aos céus).

É um deus a ser buscado nos momentos que estamos desenvolvendo projetos, buscando cura medicinal, ou aprimorando nossas artes e talentos. Mas também reverenciado nas colheitas, sejam elas metafóricas em nossas vidas, ou reais na agricultura.