Os textos dessa série serão escritos sempre pelo nosso druida, Ávillys d'Avalon, e
assim trazem as percepções, estudos e compreensões do druida e de
nossas práticas clânicas, muitas vezes com um caráter profundo de gnose
pessoal, ou seja, não dependendo muito de referências bibliográficas
específicas. Muitas das bibliografias sobre os deuses celtas são
profundamente pessoais e subjetivas já que os druidas do passado não nos
deixaram efetivamente nenhum texto escrito ou orientação fundamental.
Esse em específico, tem caráter profundamente de gnose pessoal, uma vez
que é arduamente difícil achar algo histórico e antigo sobre Danú.
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Por Ávillys d'Avalon.
Essa deusa,
particularmente, atinge muitas controvérsias entre druidistas
reconstrucionistas e seguidores da espiritualidade céltica. Por vários anos,
por um erro de tradução, acreditava-se que o nome “Danú” era uma corruptela do
nome da deidade “Anu”, considerada a Grande Mãe irlandesa, cujo corpo seria a
própria terra da Irlanda, e cujo leite teria amamentado os Deuses. Assim, o
nome Tuatha dé Danann foi
erroneamente traduzido como “Tribo de Danú”.
Com o passar do tempo, essas falhar
foram se evidenciando, uma vez que não há nenhuma menção a Danú na saga
irlandesa, e quando a palavra “danann”
aparecia, vinha como genitivo de “danand”
(talento). A palavra “tuatha” também
foi demarcada como plural de “tuath”,
o que condiz com os mitos que mostram várias tribos unidas. E assim, a tradução
mais correta seria “Tribos dos Deuses Talentosos”, já que mitologicamente
qualquer um com talento realmente excepcional seria aceito entre os Tuatha dé Danann, como aponta ao fato
deles reunirem pessoas de vários povos (até inimigos como os Fomores), além do mito de Lugh que é
cobrado a ele um talento para entrar na tribo e ele é aceito por mostrar
possuir 365 talentos.
Assim, inicialmente, parecia ser
descartada a ideia de Danú ser uma corruptela de Anu, mas não faria sentido
falar que ela era uma deidade inexistente, uma vez que ela ainda é venerada
fortemente na Irlanda. Ao menos para o clã, não fazia sentido...
Em minhas buscas, deparei em uma
conversa com uma pessoa de grande conhecimento e renome entre a
comunidade céltica brasileira, e, conversando sobre isso, ela apontou para uma possibilidade pouco observada: Danú pode ser uma corruptela da deusa belga Don. É um
fato mitológico de que os Fir Bolg
(povo belga) habitou a Irlanda antes dos Tuatha
dé Danann, e que muitos deuses Fir
Bolg foram aceitos entre os Tuatha dé,
entre eles a deusa Tailtiu, mãe adotiva de Lugh. Assim, faz sentido que Don,
deusa da fertilidade, das chuvas e dos rios, também tivesse sido aceita e
incorporada no culto às deidades locais, se mostrando como uma deusa antiga e
pouco descrita nos mitos... Deusa que, na mitologia Belga, teria levado seu
povo, através dos rios, a uma terra onde eles poderiam prosperar: a Irlanda;
onde, mitologicamente, tiveram os anos mais prósperos e pacíficos da Irlanda (o
reinado dos Fir Bolg).
Saber disso, fez todo sentido, pois
Danú sempre se mostrou no clã como uma deusa das águas, da chuva, da lama, da
terra fértil, exatamente como Don entre os Fir
Bolg. E assim Danú é reverenciada entre nós: uma deusa antiga, responsável
pela manutenção da terra, da fertilidade, das águas pluviais e fluviais. É a
chuva fina que fertiliza a terra e germina o grão. É a terra fértil, verde e
coberta de grãos. É a deusa que nos promete e nos conduz ao nascimento de um
novo momento, de uma nova era em nossas vidas. Deusa ancestral, cujo poder é
sentido no fundo do nosso interior, é visto na terra plena e sadia, é uma deusa
da promessa. Não a enxergamos como a Grande-Mãe, nem como Anu, a Terra
Irlandesa, mas como a deusa que rege o solo fértil e sadio em todos os lugares.
Ela pode ser pensada como a Mãe Terra, como a natureza fértil, mas, para o clã,
a natureza em todo seu potencial é reverenciada através das faces de
Cailleach-Beara.