Referências

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Panteão Clânico - Parte 3: o deus Dagda

Os textos dessa série serão escritos sempre pelo nosso druida, Ávillys d'Avalon, e assim trazem as percepções, estudos e compreensões do druida e de nossas práticas clânicas, muitas vezes com um caráter profundo de gnose pessoal, ou seja, não dependendo muito de referências bibliográficas específicas. Muitas das bibliografias sobre os deuses celtas são profundamente pessoais e subjetivas já que os druidas do passado não nos deixaram efetivamente nenhum texto escrito ou orientação fundamental. 


Link da imagem

Por Ávillys d'Avalon.


Dagda, cujo nome significa “O Bom Deus”, é um dos deuses mais conhecidos e adorados dentre os povos celtas. É pai de Brighid, de origem fomoriana (seres ou deuses antigos, conhecidos por serem corruptos, cruéis), filho de Elatha e Eithiniu, irmão de Oghma e meio irmão de Lugh; foi aceito e se tornou parte dos Tuatha dé Danann.
            
 Geralmente é descrito como sendo um gigante (como a maioria dos fomores), Dagda possui uma clava mágica bifurcada chamada de Lorg Anfaidh, que quando usada de um lado poderia matar e do outro poderia trazer os mortos que ainda possuíssem cabeça de volta a vida. Sua clava seria gigantesca, precisando de nove homens para carregá-la. A ele também pertence a Uaithne, sua harpa de carvalho, com qual ele toca as melodias que mudam as estações do ano. Sua harpa toca em três frequências: Goltraí (melodia da tristeza), Geantraí (melodia da alegria) e Suantraí (melodia do sono / êxtase). Tanto a clava quanto a harpa são atributos que ligam Dagda como um deus do clima (a clava como representação do raio e a harpa com o poder de mudar e controlar as estações), sendo a ele atribuído os potenciais do plantio e da colheita.
             
Além disso, Dagda é o guardião do Coiri in Dagda (Caldeirão do Dagda), dado aos Tuatha dé Danann pelo mago Semias de Murias (uma das quatro ilhas ao norte do mundo onde os Tuatha dé Danann estiveram aprendendo as artes da druidaria e onde foram presenteados por quatro magos com os Quatro Tesouros que os possibilitaram possuir a soberania em Ériu [Irlanda]). O coiri in Dagda também é chamado como Caldeirão da Abundância, já que ele está sempre cheio de alimento. Assim, Dagda também é considerado deus da abundância, da prosperidade e da fartura, talvez seus principais atributos, uma vez que ele provém as colheitas e mantém consigo o caldeirão do eterno alimento.
            
 Outro atributo de Dagda é como deus da magia e da sabedoria, intitulado Rúadh Rofhessa (“Ruivo de Todo Conhecimento”), mostrando seus dotes como deus da sabedoria e do conhecimento. Na verdade seu nome / título “dagda” (“o bom deus”), não especifica que ele seja necessariamente bom no sentido de bondade, mas sim de que ele é bom em todos os ofícios ou atributos. Dagda é também chamado Eochaid Ollathair (“Cavaleiro Pai de Todos”) e de Aed Abaid (tradução desconhecida). O título “Pai de Todos” demonstra a importância dele enquanto deus da sobrevivência, da vida e da morte, do controle terreno. Ele é um pai que cuida de todos os seus filhos. É descrito assim como um deus de cuidados paternais, bondoso e generoso com aqueles que guia e protege.
            
 Dagda faz morada no Brugh na Boinne (hoje Newgrange), na Irlanda. Mas outros lugares também são associados a ele como Tara, colina de Uisneach, e o rio Unshinn, onde Dagda encontrou e se deitou com a deusa Morrigan trazendo soberania aos Tuatha dé Danann na segunda batalha de Magh Tuiread (Moytura).
            Deixo para vocês uma reflexão feita por Bellouesus Isarnos no Facebook[1] a partir das traduções de antigos manuscritos relacionados com o ciclo do conhecimento e sabedoria...


Rúad-Rofhessa (Senhor do Grande Conhecimento), isto é, um nome para o Dagdae (Sanas Chormaic, trad. John O’Donovan, 1868, p. 144).
Aisiu, isto é, Aed, era o filho de Dán (Poesia), filho de Osmenta (Observação), filho de Imrádud (Reflexão), filho de Rofhis (Grande Conhecimento), filho de Fochmarc (Interrogação), filho de Rochmarc (Pesquisa), filho de Rofhis (Grande Conhecimento), filho de Rochond (Grande Percepção), filho de Ergna (Entendimento), filho de Ecna (Sabedoria), filho dos três deuses da poesia, três filhos de Bres mac Elathan e Brigit, a poeta, filha do Dagdae Mór, que era chamado o Rúad Rofhessa, filho de todas as ciências (dána), isto é, um filho com quem estão todas as ciências (Lebor Laignech, fl. 194a, col.3).

O Grande Conhecimento
nasce da Poesia,
que nasce da Observação,
que nasce da Reflexão,
que nasce do Grande Conhecimento,
que nasce da Interrogação,
que nasce da Pesquisa,
que nasce do Grande Conhecimento,
que nasce da Grande Percepção,
que nasce do Entendimento,
que nasce da Sabedoria,
e é filho dos três deuses da poesia (tri dé dána),
nascidos de Bres, filho de Elatha, e de Brigit, filha do Dagdae Mór,
chamado Rúad Rofhessa (Senhor do Grande Conhecimento).


                        
“Eu sou Aed Abaid de Ess Rúaid, que é, o Bom Deus da feitiçaria da Tuatha Dé Danann, e Rúad Rofhessa e Eochaid Ollathair são meus três nomes.”


  •    Referência bibliográfica e leitura sugerida: "Quem é Dagda" in O Templo de Dagda.


[1] Transcrita no literal em Bellouseus Isarnos, Facebook.
 

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Abertura de Inscrição para Turma Semente 2019



A Turma Semente é um projeto que visa discutir o básico da espiritualidade céltica adotada e trabalhada pelo clã. É como pensar que as pessoas são sementes que serão plantadas e regadas pelo conhecimento passado. Cada uma crescerá e germinará a seu tempo, de acordo com sua forma. As aulas serão totalmente ONLINE, por vídeo-aulas postadas semanalmente.

O Curso é gratuito aos interessados. As aulas começarão a partir de 25/02/2019, mas interessados poderão se inscrever até 02/03/2019.

--> Para se inscrever basta clicar aqui, preencher e aguardar contato oficial.

Venha estudar sobre a espiritualidade céltica conosco, de maneira segura e orientada!

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

Panteão Clânico - Parte 2: a Deusa Brighid

Os textos dessa série serão escritos sempre pelo nosso druida, Ávillys d'Avalon, e assim trazem as percepções, estudos e compreensões do druida e de nossas práticas clânicas, muitas vezes com um caráter profundo de gnose pessoal, ou seja, não dependendo muito de referências bibliográficas específicas. Muitas das bibliografias sobre os deuses celtas são profundamente pessoais e subjetivas já que os druidas do passado não nos deixaram efetivamente nenhum texto escrito ou orientação fundamental.


Imagem de autoria desconhecida




Por Ávillys d'Avalon.


 Brighid (Brigit, Brida, Bride, Brígida) é sem dúvida uma das mais conhecidas e adoradas deusas celtas. É poetisa, deusa do fogo, da cura, da inspiração, das águas, das batalhas, da vida e da morte. Celebrada principalmente na renovação da terra que se inicia no festival de Imbolc, no hemisfério norte ele antecede a Primavera. É considerada protetora dos bardos e patrona das artes.

      
 Sabe-se que ela é filha do Dagda (o Bom Deus), mas sua mãe é desconhecida nos dias de hoje, não nos chegou registros através do tempo e das histórias. Portanto, não há certeza se ela é de linhagem toda fomoriana ou parcial, já que Dagda é filho de pai e mãe fomorianos. Independente disso, ela é aceita, amada e adorada entre os Tuatha dé Danann, sendo casada com o fomoriano Bres, deus da agricultura, que durante seu reinado tornou-se um tirano entre os Tuatha dé até ser deposto por Nuada, o que conduziu à Segunda Batalha de Magh Tuiread, contra os fomorianos. Brighid teve um filho, Ruadan
            
 Vale lembrar que os Fomores seriam uma raça antiga e inacabada de seres e deuses do passado terrestres, com quem os Tuatha dé Danann (as tribos dos Deuses Talentosos da Irlanda) eram por vezes aliados e por outras inimigos.
           
 Brighid é conhecida por ser uma Deusa Tríplice, ou seja, possuir três lados ou três dons: a curandeira / médica, a ferreira, a bardisa. Posteriormente, foi canonizada pela Igreja Celta (uma Igreja de base católica local nas Ilhas Britânicas, mas ainda não reconhecida oficialmente pelo Vaticano), como Saint Brighid (ou Santa Brígida), padroeira da Irlanda. Entre os milagres da santa, descreve-se que ela possuía três fogos: o fogo da lareira, onde preparava a cura com as ervas; fogo nas mãos, que representava seu trabalho manual com a forja; e o fogo sobre a testa, representando o Imbas, a inspiração. Ela regia poços mágicos e sagrados. No mito, dois doentes (possivelmente lepra) teria chegado a ela pedindo cura, ela ordenou que o primeiro se banhasse em seu poço, e quando o fez, saiu curado. Então ela ordenou que o primeiro (que havia se curado) banhasse o segundo para também curar o amigo. Agora curado, o primeiro se recusou a tocar no amigo, mesmo sob o comando da deusa / santa, e assim, Brighid curou o segundo e devolveu a doença ao primeiro, ensinando que o amor deve estar além das aparências.
             
Hoje, sob tutela da Igreja Celta, em Kildare / Irlanda, existe um Poço sagrado, em que são atribuídas propriedades mágicas a água, consagrado a Santa Brígida.
             
Contudo, o que muitos também não sabem, é que a deusa possui um lado sombra, um quarto lado... A morte. Ela é deusa da morte, em geral associada à boa morte, tanto quanto é protetora das parturientes. A morte, pode ser vista como uma cura para o sofrimento que não possui cura terrena, e assim também é uma das artes de Brighid. Ela possui quatro animais sagrados, apesar de ser a vaca branca com orelhas vermelhas o mais conhecido. Mas não devemos nos esquecer da cobra, do lobo e do abutre. A vaca é sinal de prosperidade, vida; além disso a vaca branca com orelhas vermelhas é conhecida por ser uma condutora com o Outro Mundo, outras vezes, um animal pertencente ao Outro Mundo. A cobra, sinal de conhecimento e independência. O lobo remete à família, ao doméstico. E o abutre, à morte.
           
 Enquanto deusa, ela é celebrada e adorara por carregar consigo o Imbas, o fogo sagrado da inspiração e da elevação espiritual que queima na testa dos artistas. Sua devoção é um tanto quanto profunda, já que ela toca e mexe no profundo, na essência. Sua cura é uma cura que vem de dentro para fora, do espiritual para o físico. Sua forja endireita e ensina os homens a viver e a lutar pela e através da honra. No paganismo, não há quem tenha contato com essa deusa e não se apaixone. Em sua potencialidade, ela eleva sempre o que há de melhor em nós, auxiliando na purificação dos males e negatividades.
             
Ela faz parte de uma das deusas mais adoradas no feminismo, por se mostrar sempre uma deusa da potencialidade indomada e livre do feminino. Além disso, sobreviveu ao tempo e a cristianização, mantendo-se forte inclusive no cristianismo, com várias orações e preces que sobrevivem à história e parecem se remeter a uma deusa que abençoa e cuida das mulheres, mais do que a uma santa.



  • Prece medieval de Brighid que sobreviveu os séculos: no Youtube 



Letra (irlandês):
Gabhaim molta Bríghde, iníon í le hÉireann
Iníon le gach tír í, molaimís go léir í.
Lóchrann geal na Laighneach, soils' ar feadh na tíre
Ceann ar óigheacht Éireann, ceann na mban ar míne.

Tig an Geimhreadh dian dubh, gearra lena géire
Ach ar lá le Bríghde, gar dúinn Earrach Éireann.
Gabhaim molta Bríghde, iníon í le hÉireann
Iníon le gach tír í, molaimís go léir í.

Tradução Livre (por Ávillys d’Avalon):
Eu faço uma prece a Brigit, filha da Irlanda
Filha de todas as terras, deixe-nos fazer uma prece a ela
A brilhante lanterna de Lainster, brilhando pelo país
A jovem líder da Irlanda, líder das mulheres

A casa do inverno está escura, golpeando com precisão
Mas no Dia de Brigit, na Irlanda a primavera se aproximará de nós
Eu faço uma prece a Brigit, filha da Irlanda
Filha de todas as terras, deixe-nos fazer uma prece a ela