Os textos dessa série serão escritos sempre pelo nosso druida, Ávillys d'Avalon, e assim trazem as percepções, estudos e compreensões do druida e de nossas práticas clânicas, muitas vezes com um caráter profundo de gnose pessoal, ou seja, não dependendo muito de referências bibliográficas específicas. Muitas das bibliografias sobre os deuses celtas são profundamente pessoais e subjetivas já que os druidas do passado não nos deixaram efetivamente nenhum texto escrito ou orientação fundamental.
Imagem de autoria desconhecida |
Por Ávillys d'Avalon.
Brighid (Brigit,
Brida, Bride, Brígida) é sem dúvida uma das mais conhecidas e adoradas deusas
celtas. É poetisa, deusa do fogo, da cura, da inspiração, das águas, das
batalhas, da vida e da morte. Celebrada principalmente na renovação da terra
que se inicia no festival de Imbolc, no hemisfério norte ele antecede a
Primavera. É considerada protetora dos bardos e patrona das artes.
Sabe-se que ela é filha do Dagda (o
Bom Deus), mas sua mãe é desconhecida nos dias de hoje, não nos chegou
registros através do tempo e das histórias. Portanto, não há certeza se ela é
de linhagem toda fomoriana ou parcial, já que Dagda é filho de pai e mãe
fomorianos. Independente disso, ela é aceita, amada e adorada entre os Tuatha
dé Danann, sendo casada com o fomoriano Bres, deus da agricultura, que durante
seu reinado tornou-se um tirano entre os Tuatha dé até ser deposto por Nuada, o
que conduziu à Segunda Batalha de Magh Tuiread, contra os fomorianos. Brighid
teve um filho, Ruadan
Vale lembrar que os Fomores seriam
uma raça antiga e inacabada de seres e deuses do passado terrestres, com quem
os Tuatha dé Danann (as tribos dos Deuses Talentosos da Irlanda) eram por vezes
aliados e por outras inimigos.
Brighid é conhecida por ser uma
Deusa Tríplice, ou seja, possuir três lados ou três dons: a curandeira /
médica, a ferreira, a bardisa. Posteriormente, foi canonizada pela Igreja Celta
(uma Igreja de base católica local nas Ilhas Britânicas, mas ainda não
reconhecida oficialmente pelo Vaticano), como Saint Brighid (ou Santa Brígida),
padroeira da Irlanda. Entre os milagres da santa, descreve-se que ela possuía
três fogos: o fogo da lareira, onde preparava a cura com as ervas; fogo nas
mãos, que representava seu trabalho manual com a forja; e o fogo sobre a testa,
representando o Imbas, a inspiração. Ela regia poços mágicos e sagrados. No
mito, dois doentes (possivelmente lepra) teria chegado a ela pedindo cura, ela
ordenou que o primeiro se banhasse em seu poço, e quando o fez, saiu curado.
Então ela ordenou que o primeiro (que havia se curado) banhasse o segundo para
também curar o amigo. Agora curado, o primeiro se recusou a tocar no amigo,
mesmo sob o comando da deusa / santa, e assim, Brighid curou o segundo e
devolveu a doença ao primeiro, ensinando que o amor deve estar além das
aparências.
Hoje, sob tutela da Igreja Celta, em
Kildare / Irlanda, existe um Poço sagrado, em que são atribuídas propriedades
mágicas a água, consagrado a Santa Brígida.
Contudo, o que muitos também não
sabem, é que a deusa possui um lado sombra, um quarto lado... A morte. Ela é
deusa da morte, em geral associada à boa morte, tanto quanto é protetora das
parturientes. A morte, pode ser vista como uma cura para o sofrimento que não
possui cura terrena, e assim também é uma das artes de Brighid. Ela possui
quatro animais sagrados, apesar de ser a vaca branca com orelhas vermelhas o
mais conhecido. Mas não devemos nos esquecer da cobra, do lobo e do abutre. A
vaca é sinal de prosperidade, vida; além disso a vaca branca com orelhas
vermelhas é conhecida por ser uma condutora com o Outro Mundo, outras vezes, um
animal pertencente ao Outro Mundo. A cobra, sinal de conhecimento e
independência. O lobo remete à família, ao doméstico. E o abutre, à morte.
Enquanto deusa, ela é celebrada e
adorara por carregar consigo o Imbas, o fogo sagrado da inspiração e da
elevação espiritual que queima na testa dos artistas. Sua devoção é um tanto
quanto profunda, já que ela toca e mexe no profundo, na essência. Sua cura é
uma cura que vem de dentro para fora, do espiritual para o físico. Sua forja
endireita e ensina os homens a viver e a lutar pela e através da honra. No
paganismo, não há quem tenha contato com essa deusa e não se apaixone. Em sua
potencialidade, ela eleva sempre o que há de melhor em nós, auxiliando na
purificação dos males e negatividades.
Ela faz parte de uma das deusas mais
adoradas no feminismo, por se mostrar sempre uma deusa da potencialidade
indomada e livre do feminino. Além disso, sobreviveu ao tempo e a
cristianização, mantendo-se forte inclusive no cristianismo, com várias orações
e preces que sobrevivem à história e parecem se remeter a uma deusa que abençoa
e cuida das mulheres, mais do que a uma santa.
- Leitura sugerida: "Brighid além da lareira" in Recon Celta.
- Prece medieval de Brighid que sobreviveu os séculos: no Youtube
Letra (irlandês):
Gabhaim molta Bríghde, iníon í le
hÉireann
Iníon le gach tír í, molaimís go
léir í.
Lóchrann geal na Laighneach,
soils' ar feadh na tíre
Ceann ar óigheacht Éireann, ceann
na mban ar míne.
Tig an Geimhreadh dian dubh,
gearra lena géire
Ach ar lá le Bríghde, gar dúinn
Earrach Éireann.
Gabhaim molta Bríghde, iníon í le
hÉireann
Iníon le gach tír í, molaimís go
léir í.
Tradução Livre (por Ávillys d’Avalon):
Eu faço uma prece a Brigit, filha
da Irlanda
Filha de todas as terras, deixe-nos
fazer uma prece a ela
A brilhante lanterna de Lainster,
brilhando pelo país
A jovem líder da Irlanda, líder
das mulheres
A casa do inverno está escura, golpeando
com precisão
Mas no Dia de Brigit, na Irlanda
a primavera se aproximará de nós
Eu faço uma prece a Brigit, filha
da Irlanda
Filha de todas
as terras, deixe-nos fazer uma prece a ela